Fonte: http://www.ribeiraonoticias.net/2014/11/bandido-tenta-estourar-caixa-eletronico.html |
O Estado de São Paulo passa por um período
atual com diversas ocorrências de “assaltos” a caixas eletrônicos, onde
indivíduos explodiam o maquinário para subtrair grandes quantias em dinheiro. Segundo
o site G1 em notícia publica em 11 de novembro de 2014 com título “Região soma 40 registros de furto ou roubo a caixas eletrônicos neste ano: Segundo delegado de São Carlos, SP, dinheiro
roubado abastece facções. Frequência dos crimes assusta moradores e provoca mudança de hábitos”, só na
região de São Carlos havia 40 casos de “roubo ou furto de caixas eletrônicos”
em 2014, conforme apontado pelo DEIC (Departamento Estadual de Investigações
Criminais), da Polícia Civil. “O último na madrugada desta quinta-feira (11), em Mococa (SP). Quase todos os dias
um caixa eletrônico é alvo de criminosos no estado e, desde o início do ano,
foram mais de 300 ocorrências desse tipo”[1].
Apesar do uso de explosivos para chegar ao
objetivo, causando grande dano no perímetro e terror na vizinhança,
juridicamente não estamos diante a hipótese de roubo, mas sim de furto (ambos
os crimes do Código Penal, contra o Patrimônio). Eis a diferenciação entre os
crimes:
-
Furto:
Art. 155 - Subtrair, para si ou para
outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§
1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso
noturno.
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz
pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois
terços, ou aplicar somente a pena de multa.
§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha
valor econômico.
Furto qualificado
§ 4º - A pena é de reclusão de dois a
oito anos, e multa, se o crime é
cometido:
I - com destruição ou rompimento de
obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
§
5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo
automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.
O crime de furto consiste em tão somente subtrair algo que não é seu,
independente se alguém viu ou não. Digo isso porque é muito comum dizerem
“furto é quando não vê, roubo e quando vê”. É um erro comum, pois é dever dos
operadores do Direito (Juiz, Promotor, Advogado, Polícia,...) saber o técnico.
Importante destacar que o § 4º torna o Furto
qualificado, aumentando sua pena no mínimo e no máximo, quando há a
destruição ou rompimento de obstáculo para ter a posse do bem desejado. E como
exemplo, temos os casos em que o indivíduo usa explosivos para destruir o caixa
eletrônico para então subtrair o dinheiro que dentro dele estava.
-
Roubo:
Art.
157 - Subtrair coisa móvel
alheia, para si ou para outrem, mediante
grave ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer
meio, reduzido à impossibilidade de
resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo
depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a
fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para
terceiro.
§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:
I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;
II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;
III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece
tal circunstância.
IV
- se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para
outro Estado ou para o exterior;
V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade.
§ 3º Se da violência resulta lesão
corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se
resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.
Vemos
que o crime de Roubo inicia seu texto (tipo penal) idêntico ao do Furto, porém,
ele exige que a subtração, a tomada da posse do bem, seja feita violência ou grave ameaça ou com redução da capacidade de
resistência, tudo contra pessoa,
seja ela a detentora do bem ou não. Exemplo (infelizmente mais do que comum e
cotidiano) é do indivíduo que aborda o pedestre e, apontando-lhe uma faca
(grave ameaça) ou desferindo-lhe golpes (violência), pega o celular e foge.
Agora, reparem no § 1º. Também está sujeito às penas do Roubo simples (do caput) quem não usa de violência ou grave ameaça para subtrair o bem, mas sim depois ter feito para que fique com
o bem ou para que fuja e fique impune, o que é chamado de Roubo impróprio (enquanto o próprio é a
figura do caput). Como exemplo,
podemos citar o indivíduo que pega a bicicleta de um ciclista que parou para
beber água e é perseguido por um colega da vítima. Para ficar impune e na posse
do bem, saca uma arma de fogo e aponta para o perseguidor, que desiste da
recuperação da bicicleta do colega. Há um caso prático muito interessante de um
indivíduo que furtava água, por ligação hídrica clandestina que derrubou o
fiscal de uma escada para então desfazer a “gambiarra”, mas fica para outra
oportunidade.
Interessante para o caso concreto que estudaremos logo a seguir a leitura do § 3º, que prevê a qualificadora quando há lesão corporal grave ou morte na ação criminosa de roubo. Na primeira parte (“Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa”), temos o Roubo qualificado pela lesão corporal grave; na segunda parte (“se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa”), temos o Roubo qualificado pela morte, chamado por técnicos e leigos de Latrocínio. Ambas qualificadoras ocorrem, segundo entendimento da doutrina e dos julgadores, com lesão grave ou morte de qualquer pessoa envolvida no crime, seja vítima (dono do bem ou quem recebe ameaça ou violência), seja um dos próprios roubadores.
Diferenciado o Furto do Roubo, temos a questão: se na explosão a caixa eletrônico para subtração do dinheiro não tem, geralmente, violência contra pessoa, é possível haver latrocínio?
Ocorre que muitos indivíduos acabam se
juntando para formar quadrilhas especializadas no assunto e trazem consigo
armas de fogo de todo tipo, incluindo fuzis, para caso haja intervenção humana em
suas ações. Aí surge outra questão: se após ou durante uma empreitada criminosa
de furto a caixas eletrônicos com destruição do equipamento com explosivos
surge a polícia ou seguranças para impedir o ato e os assaltantes reagem com
tiros, os quais matam alguém, para então fugir, ainda estaremos diante do crime
de furto qualificado?
A tese é que não, mas para entendê-la,
estudaremos e analisaremos um caso concreto.
CASO
CONCRETO
Indivíduos fortemente armados entram na
agência de um famoso banco, em plena madrugada, explodem os caixas eletrônicos
e pegam valores em espécie, subtraindo-os.
Policiais militares são acionados pelo alarme
e vão ao local, onde entram e ouvem barulho de pessoas. Em seguida, ouvem disparos
de arma de fogo e, então, veem dois indivíduos na laje da agência, efetuando
disparos de arma de fogo, bem como outros indivíduos efetuando disparos de
dentro de um veículo não identificado, estacionado em uma rua paralela, todos
visando atingir os militares.
Uma viatura chega para apoio aos policiais e
seus ocupantes são atingidos por projéteis de arma de fogo, sendo que um dos deles
é atingido no braço e na perna direita, sofrendo lesão corporal grave, e o segundo
policial ocupante da viatura ferido gravemente, chegando a óbito.
Durante o tiroteio, outros 06 policiais são
feridos.
Assim, os criminosos fogem com o dinheiro.
Vamos à análise e ao estudo deste caso:
Os criminosos iniciaram Furto à agência bancária com uso de explosivos para destruir os caixas eletrônicos, ora obstáculos. Com a chegada dos policiais
ao local, utilizaram de violência para conseguir
fugir com o dinheiro. Assim o que a princípio era um Furto qualificado,
tornou-se crime de Roubo impróprio,
figura do artigo 157, § 1º do Código Penal.
Do Roubo impróprio (que ainda é Roubo), resultou a morte de um policial. Logo,
trata-se do crime de Latrocínio, nos
moldes do artigo 157, § 1º e 3º, segunda parte, do Código Penal, pois agiram
com fins patrimoniais e a morte, bem como o perigo à vida dos demais policiais,
foi para assegurar a impunidade do roubo.
Assim, nos ensinamentos de Rogério Greco:
As qualificadoras acima mencionadas – lesão
corporal grave e a morte – são aplicadas em ambas as espécies de roubo, vale
dizer, no roubo próprio, bem como no roubo impróprio. O importante, como já
registramos, é que tenha sido consequência da violência.[2]
No caso em tela, temos uma modalidade de Latrocínio consumado, pois os
criminosos, além de subtrair o dinheiro, mataram um policial. Importante fazer
uma observação mais técnica: mesmo
que não haja a subtração da coisa (bem, res)
e tão somente sua tentativa, mas havendo a morte de alguém no contexto, o crime
de Latrocínio é consumado. Neste sentido:
Finalmente, hoje, como terceira e majoritária
posição, temos aquela adotada pelo STF, o qual deixou transparecer seu
entendimento por meio da Súmula 610, assim redigida:
Súmula
610. Há crime de latrocínio quando o homicídio se consuma, ainda que não
realize o agente a subtração de bens da vítima.
Para essa corrente, basta que tenha ocorrido o
resultado morte para que se possa falar em latrocínio consumado, mesmo que o
agente não consiga levar a efeito a subtração patrimonial.[3]
Quanto ao policial gravemente ferido, o
que garantiu a fuga dos criminosos, temos um caso de Roubo impróprio qualificado pela lesão corporal grave, figura do
artigo 157, § 1º e § 3º, primeira parte, do Código Penal.
Por fim, quanto aos outros policiais
feridos (lesão leve), houve os crimes de Roubo impróprio, do artigo 157, § 1º, do Código Penal, uma vez que
foi utilizada violência contra eles para garantir a impunidade.
Quanto à competência do juízo, no caso
em tela, os crimes em questão são contra o patrimônio (Latrocínio e Roubo
impróprio) e contra a paz pública (Associação criminosa, antigo “Quadrilha ou bando”-
art. 288 do Código Penal) e não contra a vida. Assim, não são de competência do
Júri, uma vez que não estão nos termos do artigo 74 do Código de Processo
Penal, mas sim da Justiça Criminal Comum.
E no que isso influencia? No fato de que o
julgador da causa será um Juiz de Direito, pessoa técnica do direito
devidamente investida no cargo, devendo decidir com o Livre convencimento
motivado (escolhe a decisão fundamentando estritamente na lei e nas provas dos
autos), enquanto no Tribunal do Júri, quem julgaria seriam pessoas leigas
quanto à ciência do Direito (geralmente), pessoas estas do povo que decidem com
base na Consciência e no Íntimo convencimento (no seu íntimo pessoal, por
sentimentos, até por dó ou ódio).
CONCLUSÃO
Logo no início, vimos que apesar de
popularmente não distinguir-se roubo de furto, a explosão de caixas eletrônicos
na calada da noite e sem outras pessoas além dos criminosos do local em regra é
hipótese de Furto. Após análise e estudo da lei e de um caso concreto, vimos
que é totalmente possível ocorrer o crime de Latrocínio quando os criminosos
usam de violência para garantir a efetividade do furto, garantindo a posse da
coisa ou a impunidade do crime.
Isso quer dizer que temos de avaliar caso por
caso para saber em qual crime incorre o indivíduo que visa subtrair dinheiro de
caixas eletrônicos através de explosão, podendo haver tanto o Furto qualificado
quanto o Roubo, este qualificado ou impróprio, havendo grande diferença nas
penas para quem comete tal ato criminoso.
Vladimir Vitti Júnior
Advogado
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(11) 2668-5601
[1] G1. Região
soma 40 registros de furto ou roubo a caixas eletrônicos neste ano. Disponível
em < http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2014/12/regiao-soma-40-registros-de-furto-ou-roubo-caixas-eletronicos-neste-ano.html
. Acesso em 06 de fevereiro de 2015.
[2] Rogério
Greco. Atividade Policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos
e constitucionais.- 4 ed. Niterói: Impetus, 2012, p. 219.
[3] Idem, p.
219.
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